quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Jarra - Aleluia

A fábrica de cerâmicas Aleluia produziu, durante o período de 1940 a 60, um conjunto de peças das que melhor traduzem um vocabulário modernista na cerâmica decorativa em Portugal.
O desenvolvimento dos princípios modernistas preconizados pela Bauhaus foi drasticamente interrompido pela Segunda Guerra Mundial, tendo sido retomado após a guerra, tanto nos Estados Unidos como na Europa.
As chamadas formas livres, baseadas nas formas da Natureza, introduzidas pelos designers escandinavos, definem os volumes orgânicos de grande parte dos objectos de cerâmica produzidos durante a década de 50.
Nesta época, a fábrica Aleluia é responsável pela produção de um conjunto peças decorativas onde explora volumes orgânicos, combinados com padrões geométricos reminiscentes das composições desenvolvidas pelas correntes artísticas abstractas, no período entre as Guerras.  

Aleluia - Jarra modelo 683-A, 25 cm de altura, Anos 50. © CMP


Aleluia - Jarra modelo 683-A, 25 cm de altura, Anos 50. © CMP





Aleluia - Jarra modelo 683-A, 25 cm de altura, Anos 50. © CMP





Aleluia - Jarra modelo 683-A, 25 cm de altura, Anos 50. © CMP



Jarra modelo 683-A, detalhe. © CMP


A marca de fábrica, abaixo reproduzida, terá sido utilizada durante as décadas de 50 e 60.  
O número 683, pintado à mão, refere-se ao modelo e a letra A refere-se provavelmente à decoração. No centro da marca estão dois pequenos traços verticais, desenhados à mão, que serão provavelmente a identificação do pintor. Qualquer esclarecimento sobre estas marcas poderá aqui ser acrescentado.

Marca de fábrica. © CMP


Tanto a paleta cromática aqui observada, como a decoração relevada são características de outras peças produzidas pela Aleluia durante os Anos 50.
No entanto, a decoração aplicada na jarra 683-A é especialmente influenciada pelas estruturas geométricas de linhas a negro sobre fundo branco, conjugadas com cores primárias e secundárias, herdadas das propostas da Bauhaus, ou dos ideais mais puristas do Neoplasticismo, expressos pela revista De Stijl



Theo van Doesburg (1883-1931), composição neoplasticista, década de 1920.



Piet Mondrian (1872-1944), Composição em Vermelho, Amarelo, Azul e Preto, 1921.


A aplicação de padrões evocativos do abstraccionismo geométrico das Primeiras Vanguardas, estender-se-a à generalidade das artes decorativas, desde o mobiliário aos têxteis, durante as duas décadas subsequentes à Guerra, e, em muitos casos irá perdurar no tempo.
Reproduzem-se abaixo outros exemplares produzidos pela fábrica Aleluia neste período, representativos desta tendência.


Aleluia - Jarra, 33,5 cm de altura, Anos 50. MdS Leilões

Aleluia - Jarras, Anos 50. Aleluia


Aleluia - Jarra, 40 cm de altura, Anos 50. MdS Leilões


Aleluia - Jarra, 35 cm de altura, Anos 50. MdS Leilões


Na imagem abaixo, detalhe de um postal da década de 60, podem ver-se algumas jarras Aleluia de desenho modernista (nomeadamente um exemplar semelhante ao acima reproduzido), expostas no exterior de uma loja de loiça no centro de Alcobaça. 
Esta imagem é bastante elucidativa do gosto da época, bem como da diminuta quantidade de peças modernistas produzidas e vendidas no mercado nacional e a sua proporção em relação ao número muito mais elevado de peças tradicionais.


Loja em Alcobaça, Anos 60. © CMP

Uma das referências internacionais na produção de peças onde os volumes orgânicos se associam aos padrões geométricos,  é o francês Roger Capron (1922-2006). 
Depois de cursar a École des Arts Appliqués à l'Art et à l'Industrie de Paris, onde também foi professor, Capron estabelece-se como ceramista no sul de França, em meados da década de 40. 
Adquire uma antiga olaria provençal, a La Poterie du Font Horts, perto de Vallauris, e abre uma pequena oficina que emprega sete trabalhadores, dedicando-se à produção de  peças em pequenas séries.
Mais tarde, o seu trabalho estende-se ao mobiliário e aos painéis cerâmicos tornando-se uma referência na produção de cerâmica modernista em França.


Exterior da loja de Capron em Biot, 1960. RogerCapron

Interior da loja de Capron, 1957. RogerCapron


Jarra assinada Capron - Vallauris, 32 cm de altura, Anos 50. CeramicGlassDesign

Jarra assinada Capron - Vallauris, 32 cm de altura, Anos 50. CeramicGlassDesign

Jarra assinada Capron - Vallauris, 32 cm de altura, Anos 50. CeramicGlassDesign


Jarra assinada Capron - Vallauris, 20,8 cm de altura, 1946-52. RetroMinded


Jarra assinada Capron - Vallauris, detalhe. RetroMinded


Assinatura Capron - Vallauris. RetroMinded


Nas peças deste período, Capron utiliza muitas vezes uma técnica semelhante à corda-seca, recorrendo a uma pasta de parafina, preta ou branca, para obter a separação entre as cores. Esta técnica permite-lhe a obtenção de texturas relevadas, criando fortes contrastes entre superfícies brilhantes e baças.




Roger Capron - Garrafa de Gin, 28 cm de altura, Anos 50. RaphaelArmand

Garrafa de Gin, assinatura. RaphaelArmand

3 comentários:

  1. Mais um INCRÍVEL e educativo post. Estou começando a ficar atraído pelas peças decorativas da fábrica Aleluia, por conta dos exemplares que vocês apresentam aqui. Que perigo! (rs)
    abraços
    Fábio

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  2. Fantástico! Não conhecia este blog! Surpreendente! Fundamental!! Precisamos de mais distribuição de conhecimento com o que se encontra aqui :) Cheguei cá através da minha procura por referências sobre uma peça recentemente adquirida :) Tenho o prazer de ter um vaso idêntico ao 863-A... o 864-A :D Parece que o meu vem contrariar ligeiramente a informação que aqui colocou... Se puder entrar em contacto agradeço ;)

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  3. Cara Helena,
    muito obrigada pelo simpático comentário.
    Creio que há aqui alguma troca de números: a jarra que aqui publico é a 683-A e creio que a sua será a 684-A, um modelo de tamanho maior.
    No entanto para qualquer questão, pode sempre enviar uma mensagem para a morada, no topo da página:
    ceramicamodernistaemportugal@gmail.com

    Seja sempre bem-vinda.
    Saudações,
    CMP*

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